dezembro 06, 2013

TDAH - Parte 1

Não sei por onde começar, confesso.

Talvez do início.

Pra quem não sabe : O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância e freqüentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, inquietude e impulsividade. Ele é chamado às vezes de DDA (Distúrbio do Déficit de Atenção). - See more at: http://tdah.org.br/br/sobre-tdah/o-que-e-o-tdah.html#sthash.MDMgw89D.dpuf

Resolvi escrever aqui porque fiquei muito, muito assustada com um depoimento que li sobre TDAH e sobre o uso indiscriminado de remédios em crianças para tratamento da "doença".

Parte do depoimento que me chocou, uma mulher que "descobriu que tem TDAH e falta diagnóstico médico":

"Quando eu era pequena, com uns 7 anos, morava em Sampa, eu pegava minha caloi, e saía pelo meu bairro, descia cada ladeira sem ter freio, adorava o vendo sob meus cabelos, na sala de aula eu não conseguia ficar sentada por muito tempo, só que eu era castigada, meus primos me chamavam de trombadinha, minha casa era de andar, eu adorava ir pela janela, jogar meu corpo do lado de fora e, olhar pra baixo, fui muito comparada a minha irmã pois ela era tudo que eu não era: organizada, comportada, inteligente e, eu cada vez mais me sentindo frustrada."

Para tudo!

Eu li direito?

Várias pessoas dando depoimentos, tanto com TDAH diagnosticados, como sob suspeita, falando basicamente as mesmas coisas e descrevendo os mesmos "sintomas" e situações parecidas com as de cima.

Um resumão seria: meu filho vai mal no colégio não consegue se concentrar, repetiu de ano, desempenho escolar ruim, não consegue estudar, tem problema de relacionamento com os colegas, é apelidado de "bicho-carpinteiro" e pimentinha, meu filho não para quieto perto de mim, vive pulando, subindo em árvores e em coisas que não deveria subir, perde o interesse com facilidade, não acaba o que começa; eu perco tudo e demoro horas para sair de casa, não consigo lidar com filas, eu sempre me atraso para os meus compromissos, eu não consigo terminar uma prova, dificuldade se se formar, dificuldade em escolher a profissão, não consigo estudar em casa, quando eu chego no final da página esqueci o que li acima, minha cabeça é bombardeada por pensamentos que ficam quicando uns em cima dos outros, falo sozinho, minha cabeça é uma tempestade de idéias, me sinto perdido, socialmente rejeitado, minha família não me entende, meus professores não me entendem, as escolas não estão preparadas para lidar com isso, os professores são incompetentes e etc 1.000.000 de vezes.

 E para todos esses sintomas, sejam eles em maior ou menor escala, seja em crianças ou em adultos, são receitados medicamentos tarja preta.

"Meu quarto, minha mesa de estudo, minha bolsa são um verdadeiro caos, tal como minha cabeça. A confusão que eu faço do lado de fora é igual a que eu levo do lado de dentro." - outro depoimento que me chamou atenção.

Pois então, muito prazer, eu vou me apresentar.

Meu nome é Danielle e desde que nasci parece que sou movida a desafios, adoro despertar nas pessoas o que elas tem de melhor, ou de pior, quem sabe. Tive uma dificuldade de relacionamento absurda com a minha mãe, quando ela me batia eu gritava "bate mais que não tá doendo". Ela falava A e eu falava B, diversas vezes ela me acusou de ser a causadora dos seus cabelos brancos. Ela não me entendia, dizia que eu era barulhenta, desorganizada, desafiadora, mal-educada, caótica. Meu pai me chamava de "encrenquinha" desde pequena. Bicicleta? Não! Eu preferia patins. Descia a ladeira da minha rua com a velocidade máxima que eu pudesse alcançar, eu amava o vento nos cabelos. Nunca tive muitos amigos e continuo não tendo, na verdade eu achava todo mundo bem chato e bem aquém da minha ultra super power capacidade ilimitada de pensar 1.000 coisas ao mesmo tempo enquanto as outras pessoas eram lentas que me davam calafrios. Além disso, eu esqueço de ligar, esqueço de dar parabéns no aniversário, casamento, filhos, formatura, que amizade aguenta essas coisas? Eu era da turma do fundão, pouco prestava a atenção na aula e ficava sempre na média, pois não conseguia estudar em casa. Tinha uma invejinha branca das meninas que sentavam na frente e só tiravam notão mas, confesso que eu achava que a vida delas devia ser um saco, na verdade eu queria tirar aquele notão sem estudar (#tãoeu). Perdia a concentração na primeira folha, no final do capítulo eu nem lembrava o nome do personagem principal, fechava o livro e ia brincar. Afinal, tem mais coisas interessantes nesse vasto mundo de superpoderes ilimitados do que ficar lendo um livro escroto de história. Nunca liguei muito pra nota, eu queria era passar. Nunca liguei muito para trabalhos, eu só fazia o essencial pra não me foder (desde pequena). Subia em árvores, subia em postes, subia no vão da porta e me jogava lá de cima (#quemnunca?). Fugi de casa com 15 anos e voltei depois de três dias porque a cidadezinha que eu tinha escolhido era um tédio fora de temporada. Até hoje faço um barulho escroto com a boca tipo trincando os dentes e fazendo eles vibrarem, as pessoas ficam horrorizadas quando me pegam fazendo isso (na verdade eu me mijo de rir por dento, mas tento evitar por conta de uma etiqueta social), esse barulho que faço desde pequenininha na verdade é involuntário e me vem quando eu estou exigindo concentração máxima. Tudo que eu comecei na minha vida eu parei. Quando eu via que o negócio estava engrenando, TCHUM! Desistia, e não importa se essa desistência era consciente ou inconsciente. Eu começava a achar tudo chato, as pessoas chatas, as aulas chatas, e ia perdendo o interesse nas tarefas o que não significava que eu tinha perdido o interesse no objetivo. Até na faculdade desenhava nos cadernos, escrevia poemas, histórias, pensamentos, coisas que eram infinitamente mais interessantes do que aquelas aulas de bosta que eu estava assistindo (a maioria). E assim eu fui empurrando minha faculdade de administração até me formar, faltava aulas pra ficar pensando coisas sem sentido. Fora a administração já deixei pelo caminho cursos de inglês, espanhol, francês, faculdade de fisioterapia e engenharia mecânica, projeto do próprio negócio, MBA de marketing e etc. Várias vezes já entrei no carro só pra dar uma volta porque eu queria sair mas não sabia pra onde nem porque. Na maioria da vezes que saio de casa levo meu caderno mais bonito e minhas canetinhas coloridas e ele volta com uma linha escrita e um rabiscado poque eu não consegui transcrever as 2.486 idéias que eu tive para o papel. Filas? Tá de sacanagem, desde que eu me conheço por gente eu odeio filas. Não consigo ficar simplesmente parada esperando. Não vou a bancos, marco sempre os primeiros horários disponíveis para consultas médicas ou qualquer coisa que tenha hora marcada pois eu entro em pânico quando tem alguém na minha frente. No meu primeiro emprego eu pedi para o meu chefe diminuir meu horário de trabalho e o meu salário pois eu não precisava de 8 horas para fazer o meu serviço, em 5 eu dava conta de tudo e não conseguia ficar como uns e outros me remexendo na cadeira pra fazer hora. Perco tudo, nunca peça para eu guardar nada que seja importante ou nenhum tipo de documento. Perco coisas que eu acabei de pegar e largar, demoro horas procurando as chaves de casa, chaves do carro. Geralmente quando eu me atraso é por estar procurando alguma coisa importante que eu não consigo encontrar em tempo hábil. Faço intermináveis listas de TO-DO e tenho dois calendários gigantes presos na parede de casa. Mesmo assim esqueço compromissos, aniversários e comemorações. Essa semana coloquei o trabalho do meu filho no teto do carro enquanto tentava amarrar a menina polvo na cadeirinha e esqueci lá e fui embora pra casa. Nem lembrei, de noite eu chorei um rio por causa dos trabalhos que deveriam ter caído na rua quando eu saí com o carro, só que não, ficaram presos na grade do maleiro e meu marido achou mais tarde. Ah, por falar em marido, já perdi a conta das vezes em que brigamos por causa do meu esquecimento. Realmente um relacionamento mais íntimo pode ser extremamente prejudicado quando um dos cônjuges esquece tudo e mais um pouco, perde documentos importantes, e outras bobeirinhas do dia a dia. Mas o que importa é que eu tô cagando pra isso e não tô nem aí para os acessos de fúria dele quando eu peço para procurar o meu celular pela décima vez em menos de uma hora. Remédio para meus filhos? Minha pediatra já está mais do que avisada que eu não consigo ministrar muitos remédios de cada vez nem por períodos muito longos (tipo, mais de três dias), não consigo mesmo. Remédio pra mim? Nem me aventuro. Esqueço de manhã, de tarde e de noite e é bem provável que eu acorde de madrugada com uma vaga lembrança de que eu esqueci alguma coisa, mas eu não lembro o que. Minha pílula é obrigação do meu marido, ele já sabe, se eu engravidar de novo a culpa é dele e ponto. Parei de tomar porque tinha meses que eu esquecia 11 dias de tomar, alternando praticamente dia sim dia não.

Sim, tem dias que eu fico em casa pensando em fazer mil coisas e não consigo concluir nenhuma e as vezes, nem sair de casa. Abro a geladeira, penso, o que eu vim fazer aqui, fecho. Volto para o mesmo lugar, lembro. Volto na geladeira e penso, mas não é aqui. Vou para a área de serviço pensar e encontro um monte de roupa molhada dentro da maquina cheirando a podre porque estão esquecidas lá a três dias, boto pra lavar de novo, toca o celular, atendo, falo um monte de abobrinhas, desligo, abro a geladeira, coloco o telefone lá dentro. Fecho, como uma torrada e lembro que tenho que ligar pro meu marido e começo a procurar o telefone. Mas onde estará a merda do celular? Ligo para o celular dele do telefone fixo ele fica puto, pergunta onde tá a "porra" do meu telefone eu digo que não sei aí ele liga pra ver se o telefone toca, depois de 30 segundos de silêncio eu lembro que o telefone estava vibrando porque eu fui numa palestra há cinco dias e coloquei pra vibrar e esqueci de botar pra tocar depois. O dia se arrasta eu pensando que eu tô esquecendo alguma coisa importante, milhares de coisas pra fazer anotadas na agenda do celular que eu não lembro de cabeça, perco compromissos, perco aniversários. Marido chega do trabalho de noite cansado abre a geladeira pra pegar uma Coca e grita um "putaqueopariu" gigante quando vê meu celular na cesta de ovos. Vai me procurar no jardim porque eu estou lá há 5 minutos pensando no que diabos eu fui fazer lá, reclama, grita e no final completa: porra a área de serviço tá com cheiro de rato morto. "Porra esqueci de ligar a máquina pra bater de novo."

#eusouassimesoufelizpracaralho

Na verdade não vou ser hipócrita e falar que não tem dias que isso me irrita ao extremo, que tem dias de desânimo, cansaço mental por não saber o que fazer, por onde começar. Mas na maioria das vezes eu rio muito disso tudo e, se eu pudesse dar um conselho pra mulher do primeiro depoimento, eu falaria:

Minha filha, acorda, que porra de vida chata deve levar a sua irmã, vai pegar sua caloi e andar na lama, vai nadar pelada num rio, para de se preocupar com o que os outros pensam de você e vai ser feliz. E se você é uma criança, eu só desejo que você tenha pais de mente aberta qua sibam lidar com a situação e que você realmente seja um.. digamos... espírito evoluído para conseguir lidar com todos esses problemas e conseguir encontrar graça nisso tudo e não seguir os caminhos da depressão, desânimo e da frustração. Que isso não sirva de limitação para quem deseja voar, porque quem deseja sabe que realmente pode.

Na minha santa ignorância, acredito que as pessoas deveriam saber lidar com isso sem recorrer a remédios. Até porque eu não acho que isso seja uma doença, muito pelo contrário, é uma condição que acomete muitas pessoas, sendo que algumas lidam de forma positiva, e outras de forma negativa. A negativa sim levaria a uma patologia que talvez devesse vir acompanhada de remédio, ou de algum tipo de tratamento alternativo.

A minha opinião do TDAH em crianças, eu reservo para outro post.

Sem mais.


Dani Dani

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